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sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Grey Gardens


Eu conheci este estranho documentário através da coluna "DVD/Blu-ray", do site criticos.com.br, que todo mundo deveria ler pelo menos uma vez por semana. A princípio, não dei muita chance ao filme, interrompendo o DVD nos primeiros minutos por causa do seu ritmo lento. Ninguém deve assistir a um filme por obrigação, isso não existe! Se você está vendo algo e achando chato, é sinal de que deve parar. Acho que só existe uma exceção para essa regra, que é o cinema. No cinema temos que ter uma tolerância maior porque estamos pagando, e um filme maçante pode surpreendentemente ficar interessante. Recentemente fui assistir "A Bela da Tarde" em um cinema de São Paulo, numa sessão vespertina, o que me provocou um sono enorme depois do almoço. Cochilei e acordei já no meio da projeção, o que não me impediu de assistir o filme todo e gostar do que vi. Em outra oportunidade vejo o filme completo.

"Grey Gardens" ficou então abandonado na estante, à espera de ser um dia revisitado. E foi. Hoje dei nova chance ao filme e comecei novamente do início. De fato, o ritmo do documentário é lento e a ação muito descontinuada. Não é um filme ao estilo dos docs dos anos 2010, com entrevistas e montagem quase ficcional. É na realidade um "big brother" de 1975, só que a casa é "Grey Gardens", uma mansão pertencente a mãe e filha, duas socialites esquecidas - Edith Bouvier Beale e sua filha Edie - tia e prima de Jackie Onassis, a viúva de Kennedy. Os quatro diretores do filme acompanham o dia a dia das duas, que são caricaturas da realidade, figuras muito excêntricas. Elas moram em uma mansão precária, em um bairro de luxo de frente para o mar. A casa está caindo aos pedaços, tomada por gatos, guaxinins e muitos objetos acumulados. É, no entanto, uma bela moradia, que em outras épocas foi motivo de muita contemplação. Curiosamente, o mesmo se pode dizer de Edith e Edie, que depois de uma vida burguesa de muita atividade social, acabaram optando por uma rotina reclusa e vida monótona.

A personagem de Little Edie, a filha de 57 anos, é com certeza a mais marcante do filme. Ela sofre bastante com o seu passado, narrando para as câmeras os seus infortúnios amorosos e tudo aquilo que a sua vida poderia ter sido. A razão principal de sua tristeza está sempre na mãe, que de forma egoísta a obriga a permanecer com ela na casa, porque caso contrário estaria abandonada no mundo. Little Edie não dá entrevistas, ela atua. O documentário é a oportunidade que ela tem de falar sobre a sua filosofia de vida, de dançar para as câmeras e, sobretudo, colocar para fora a angústia que sente por estar presa à "Grey Gardens" e não poder viver em Nova York, onde se sente muito melhor. Mãe e filha são mulheres muito cultas, conhecem a música como ninguém. Há uma passagem comovente em que a mãe de 79 anos canta "Tea for Two", lembrando a época em que era cantora profissional, atividade interrompida depois que se tornou mãe e assumiu compromissos domésticos. 

"Grey Gardens" é uma história bastante comovente de duas mulheres resistindo à passagem do tempo, assim como a própria casa em que habitam. O clima é sempre bem melancólico, porque é difícil não nos identificarmos com as lamentações de Little Edie, uma figura célebre na cultura norte-americana. Ambas já faleceram e, pensando nisso, a história ganha um ar ainda mais soturno, principalmente porque ficamos nos questionando se as protagonistas realizaram aquilo que manifestaram desejo em frente às câmeras. É um documentário muito visceral, como poucos conseguiram ser, e talvez por isso não seja tão querido ou procurado. Apesar disso, é muito citado por críticos e cinéfilos como um documentário importante para ser visto por aqueles que gostam de cinema.

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