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terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Réquiem para um Sonho


Este é o segundo filme da carreira de Darren Aronofsky, diretor que já apareceu aqui no blog por "Cisne Negro" (2010) e "Mãe" (2017). Lançado no ano 2000, "Réquiem para um Sonho" conta a história de quatro personagens viciados em drogas. Tripartida em "verão", "outono" e "inverno", a obra apresenta a decadência física e moral de cada um desses quatro personagens, seduzidos pelos efeitos mágicos das drogas que consomem. Uma dessas personagens é a dona de casa Sara Goldfarb, mãe de Harry, um jovem viciado em heroína. Apesar de Harry ameaçar agredir a mãe ao ponto dela precisar se trancar dentro de um quarto enquanto ele rouba sua televisão, Sara ama o filho e é condescendente com o seu vício. 

Ela própria também tem a sua fraqueza, que é a televisão. Sara passa o dia inteiro assistindo a um programa parecido com os shows vespertinos da TV brasileira, como Faustão e Gugu, mas um pouco mais trash, como os programas de auditório do Gilberto Barros ou João Kleber. Ela sonha em um dia participar desse programa, vestida com a roupa que usou na formatura do filho, quando pesava 20 kg a menos. Quando Harry confronta a mãe sobre esse desejo, ela diz que estar na TV representa o seu motivo para acordar, em uma vida que desfez o sentido quando perdeu o marido e o filho se mudou de casa. Acontece que para emagrecer, Sara recorre a uma dieta de um médico charlatão, que receita para ela pílulas de anfetamina, um estimulante que a torna dependente, tão viciada e com surtos neuróticos semelhantes ao que o filho protagoniza durante quase todo o filme.

Harry tem um amigo e uma namorada, os outros dois personagens da história, que assim como ele são viciados em drogas e não medem esforços para conseguir dinheiro para se drogarem. Boa parte do filme se consiste na alternância entre a vida dos três amigos, que se envolvem com o tráfico, e as cenas em que Sara caminha cada vez mais para a loucura em sua solitária casa, dividida entre as pílulas de anfetamina e a TV nova que o filho compra para a mãe, ignorante que é da péssima influência que o objeto está tendo na vida dela. Sara e Harry são os fios condutores da narrativa, e a grande força no filme, por conta de suas atuações. A mãe é interpretada de forma genial por Ellen Burstyn, em papel que lhe rendeu indicação ao Oscar de melhor atriz, o que já havia acontecido por sua atuação em "O Exorcista", em 1973. Harry é interpretado pelo multi-tarefas Jared Leto, vencedor do Oscar de melhor ator coadjuvante em 2013, por "Clube de Compras Dallas".

Se a mensagem do filme é pessimista (tanto é que a primavera nem chega para os protagonistas) e de tom bastante moralista pela representação da influência das drogas na vida dos personagens, o grande trunfo do filme é mesmo a sua estética e a técnica de filmagem, que rendeu a Aronofsky muitos elogios como um diretor experimental. O tema das drogas há havia sido abordado de forma semelhante em "Trainspotting" (1996), de Danny Boyle, de modo que a inovação de "Réquiem para um Sonho" é a direção caótica, com alternância de planos longos e curtos, ritmados pela trilha sonora meio orquestrada e meio eletrônica de Clint Mansell, que em suas teclas de piano nos coloca em um ambiente tão alucinógeno quanto o criado por Richard Wright nas canções do Pink Floyd. Há uma levada trash no visual dos personagens e na posição das câmeras, inclusive com alguns erros crassos de montagem onde vemos o que não deveríamos. Ainda assim, o filme entrou para a história como uma obra cult fundamental. Apesar de sua angústia e tristeza permanente, é um dos meus filmes preferidos de Darren Aronofsky.

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