Dezesseis anos depois da segunda parte do filme mais bem sucedido de sua filmografia, Francis Ford Coppola decidiu encerrar a história dos Corleone e transformá-la em uma trilogia, lançando bem extemporaneamente uma obra que deve ter sido recebida na década de 1990 com bastante frenesi por parte do público fã da história, ainda que este público estivesse certamente dividido sobre as possibilidades da empreitada dar certo ou não. Buscando dar à história o máximo de legitimidade possível, o diretor chamou para o elenco do terceiro filme alguns dos atores e atrizes que haviam trabalhado com ele na década de 1970, com destaque para Al Pacino e Diane Keaton.
Ainda com o objetivo de manter no terceiro filme um aspecto retrô, porque a história se passa em 1979, Coppola optou por uma fotografia que remete bastante aos dois primeiros filmes da franquia, com uma belíssima qualidade de imagem, principalmente se vista em alta resolução. É como se para o público houvesse pouca ou nenhuma ruptura estética ao assistir os três filmes em sequência, com exceção é claro do visível envelhecimento dos atores já conhecidos. Neste sentido, meramente técnico, a terceira parte de "O Poderoso Chefão" é bem fiel à proposta do diretor nos trabalhos da década de 1970.
No que diz respeito à história do filme, Coppola continuou trabalhando sobre a obra de Mario Puzo, que co-assinou o roteiro. Justamente por isso, alguns temas se repetem e episódios dos filmes anteriores são referenciados na última parte da trilogia. A Igreja Católica é presença constante, mais do que havia sido anteriormente. Logo na primeira sequência do filme, vemos Michael recebendo uma comenda importante por parte do arcebispo de Nova York, um episódio que vai descortinar para o espectador uma relação bastante promíscua entre o mafioso e o clero norte-americano. A celebração que se segue à entrega da comenda é o típico momento da "festa de família", abordado tanto no primeiro quanto no segundo filme da trilogia. É o momento em que percebemos existir um abismo entre a vida pública de Michael e os encontros privados que mantém em seu escritório.
Embora o clientelismo entre Don Corleone e seus aliados continue existindo, fica muito claro que Michael está tentando "limpar" o seu nome, migrando da vida criminosa para transações milionárias no mundo financeiro. Ele está divorciado, tem dois filhos adultos e é assombrado pela culpa que sente por conta do assassinato do irmão, Fredo. Mas, como Michael mesmo diz em uma sequência célebre - "justo quando eu achava que estava fora, eles me puxam de volta" - a figura de seu sobrinho Vincent (Andy Garcia) vai assombrá-lo e carregá-lo novamente para o mundo do crime, principalmente por força de um antagonista chamado Joey Zasa. Vincent conquista em pouco tempo a confiança do tio, o que é muito simbolicamente representado na cena em que o jovem barbeia Michael, visivelmente abatido em seu quarto.
Os eventos do terceiro filme transitam entre Nova York, a Sicília e Roma, em uma história intrincada que envolve o Papa Paulo VI, Papa João Paulo I e o Banco do Vaticano. Não deixa de ser um ato audacioso escrever sobre um tema envolvendo personagens reais, o que por acaso Coppola já havia feito no segundo filme da série, quando citava Fidel Castro na trama. Há um excesso de sentimentalismo na história, principalmente porque Michael é desta vez retratado como um homem enfraquecido pela diabetes, atormentado pela culpa, pela necessidade de se regenerar e proteger sua jovem filha. Estas incursões pela vida privada de Michael soam como tentativas do autor em encerrar a trilogia transmitindo a seu público a ideia de que o crime não compensa, objetivo que será muito mais desenvolvido no desfecho da obra.
De modo geral, a terceira parte de "O Poderoso Chefão" é um filme que consegue, com certa dignidade, retomar a temática dos antecessores, ainda que sem a qualidade que marcou os filmes da década de 70, ambos vencedores do Oscar na categoria principal. Ofuscado pela falta de originalidade e por um enredo político muito óbvio e vazio, a obra ainda possui certo vigor por conta da força de seus protagonistas, especialmente Pacino e Andy Garcia, que por sinal está muito bem. Pela sua mensagem final, Coppola parece ter se comprometido a dar ao filme uma moral, talvez por ter sido acusado em alguns momentos de romantizar a vida dos mafiosos. A sensação para os espectadores é que a conclusão da trilogia tem como foco não o destino de todos os personagens importantes para a história, mas sim a sorte de Michael. É como se o tempo todo "O Poderoso Chefão" fosse um filme sobre Michael Corleone. E nesse ponto eu concordo absolutamente.
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