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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Infiltrado na Klan

O novo filme de Spike Lee não é exatamente uma obra concisa e convincente, muito menos uma arma poderosa contra o racismo ou com força e poder político suficientes para entrar para a história do cinema como alguns de seus filmes anteriores. "Infiltrado na Klan" é, por outro lado, um filme despretensioso e até certo ponto divertido sobre a história quase real de um policial negro dos EUA que consegue se tornar membro da organização extremista e racista "Ku Klux Klan", através de uma parceria com seu colega de trabalho branco como um agente infiltrado.

A história se passa em 1978 e o protagonista é Ron Stallworth, interpretado por John David Washington. Ron é um sujeito de cabelo black power e com uma consciência política e senso prático de fazer inveja aos militantes negros que esbarra ao longo da história, inclusive a garota por quem se apaixona. Enquanto os integrantes de movimentos políticos criticam a atuação racista e sexista dos policiais do Colorado, Ron secretamente atua na inteligência da polícia do estado, procurando indícios de crimes racistas pelos integrantes da KKK. Contrariando o que se esperava de sua profissão, Ron é um policial negro combativo e consciente dos preconceitos que ele e todos os outros negros sofrem diariamente. 

Há um momento em "Infiltrado na Klan" que um dos personagens frisa que organizações racistas como a "Klu Klux Klan" não deveriam preocupar as autoridades e as minorias por sua radicalidade ou violência, mas sim pela forma como pouco a pouco as suas ideias reacionárias impregnam o imaginário popular, alcançam ressonância política e elegem sujeitos racistas que irão agredir a população negra através de medidas que os excluirão das ações afirmativas e políticas sociais. Ao ouvir esse raciocínio, um personagem subestima o poder dos racistas e diz que não consegue imaginar um sujeito como David Duke - líder da KKK em 1978 - como presidente dos Estados Unidos.

Mais tarde no filme, Spike Lee escolheu encerrar a obra com cenas reais do atentado ocorrido em Charlottesville em 2017, quando supremacistas brancos e antifascistas entraram em um conflito que resultou na morte por atropelamento de Heather Heyer, uma jovem branca homenageada antes dos créditos finais. Embora a resolução da história de "Infiltrado na Klan" seja negativa para os racistas, como uma sequência até mesmo ingênua em um bar onde um policial é flagrado sendo preconceituoso com Ron, Spike Lee optou por encerrar sua obra com um clima bastante sombrio, exibindo imagens reais da ação da KKK, discursos de Trump e fechando a história com uma imagem silenciosa da bandeira dos Estados Unidos em preto e branco e de cabeça pra baixo. Fica claro que o diretor quis nos dizer que os racistas não deveriam ter sido tão subestimados em 1978 e que Trump nada mais é do que a institucionalização do racismo, muito mais pérfida do que a violência explícita que os negros temiam na década de 1970.

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