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sexta-feira, 26 de julho de 2019

Batman Begins

Assisti "Batman Begins" no cinema em 2005, mais de catorze anos atrás. Foi o renascimento do Batman nas telonas depois de uma série de produções na década de 90, algumas elogiadas e outras criticadas, mas todas com algo que as unia: uma estética estilizada e que tratava o super-herói ainda dentro de uma visão fantasiosa e lúdica, como havia sido nos quadrinhos até o surgimento de Frank Miller. Dessa leva de filmes da década de 90 eu comentei dois aqui no blog (os dirigidos pelo Tim Burton) e que eu particularmente considero filmes bons e até mesmo imperdíveis se você gosta do homem morcego. "Batman Forever" e "Batman & Robin" eu assisti quando criança, mas ainda não escrevi no blog o que penso deles. Boa parte da crítica e dos fãs detesta esses dois filmes.

Quando a DC decidiu entregar a Christopher Nolan a tarefa de co-escrever e dirigir o filme de estreia do Batman no século XXI todo mundo já sabia que haveria uma guinada para o obscuro na maneira de contar a história do morcego, porque Nolan não era propriamente um diretor de filmes de heróis e ação. Pelo contrário, Nolan tinha um breve currículo de obras intrigantes e bastante originais: Amnésia (2000) e Insônia (2002). Isso sem levar em conta que o diretor tinha e ainda tem um histórico de traçar suas narrativas sem muito apego à linearidade do tempo, o que resulta em filmes peculiares e atrativos. Foi assim que a DC apostou mais uma vez em transformar o Batman na bola da vez dos heróis no cinema, criando para ele uma história que conciliasse o realismo de Nolan e a ficção extravagante dos quadrinhos.

Na minha opinião esta postura realista em filmes de heróis é um contrassenso, justamente porque o mais atrativo em uma história de super-heróis é o seu caráter extraordinário. E neste sentido a escolha de Tim Burton para os filmes da década de 90 foi muito acertada se o objetivo era criar um filme gótico e afetado como fizeram. Mas no caso de "Batman Begins", ainda que o conceito do filme seja coerente com o seu diretor, me parece um erro contar a trajetória de Batman sob a perspectiva do real e do plausível, afinal de contas a sua origem e história vai ser sempre algo fora do comum. O que quero dizer é que se você conta uma história surreal utilizando uma estética barroca como a de Tim Burton, o irrealismo do filme não é tão latente como quando você narra uma história implausível utilizando um formato realista. E esse foi o maior erro de Christopher Nolan em "Batman Begins".

Mas o filme também tem os seus acertos e eles residem principalmente na escolha dos vilões, que se não me engano não tinham sido abordados nos filmes anteriores, como Ra's Al Ghul e o Espantalho. O elenco também é um espetáculo, com Morgan Freeman, Michael Caine, Gary Oldman, Liam Neeson, Katie Holmes e principalmente Christian Bale (como Batman), um dos meus atores favoritos de todos os tempos. O roteiro é concentrado na explicação da origem do herói e tem algumas cenas que se passam no oriente, o que não é muito bem contextualizado como deveria. Ainda assim, o filme mostra com sucesso ao espectador porque Bruce Wayne decidiu se tornar um vigilante noturno, não deixando de abordar a clássica narrativa do assassinato dos pais do herói e de sua fobia por morcegos, transformada ironicamente e subversivamente em seu símbolo. 

Há uma abordagem ética interessante e importante no filme a respeito do papel do herói como vingador e o questionamento de sua legitimidade como justiceiro. É importante dizer que Nolan é um sujeito muito mais íntegro neste aspecto do que Frank Miller (que apesar disso muito certamente influenciou indiretamente o roteiro de "Batman Begins"), porque enquanto o Batman de Miller parece ignorar que a justiça com as próprias mãos é eticamente condenável, o de Nolan reconhece que não é correto de sua parte executar um bandido, porque isso é uma tarefa da justiça. Esta honestidade do Batman de Nolan é inclusive a razão para o seu rompimento com Ra's Al Ghul, o que merece ser constatado pelo espectador, e não explicado neste texto. 

"Batman Begins" foi uma revolução na criação de heróis no cinema, mesmo que isso não seja necessariamente algo positivo para o que considero como um bom filme de super-herói. Como eu disse anteriormente, realismo nesse gênero pode ser um tiro pela culatra, mas é inegável que Nolan respeitou um personagem dos quadrinhos mais do que qualquer outro roteirista ou diretor havia feito até então no cinema. Além disso, o filme de 2005 foi produzido em um momento em que a computação gráfica e os efeitos especiais davam à história a representação gráfica que merecia, de modo que Nolan conseguiu criar no cinema aquilo que seus antecessores não foram tão bem sucedidos por limitações tecnológicas. E não dá pra ignorar que faz muito bem ao Batman ter tido um filme (ou melhor, uma trilogia) dirigida por um cineasta que está entre os melhores de sua geração. Apesar de seu realismo traiçoeiro, "Batman Begins" é um filme precursor de muitos outros do gênero, não só na DC como na Marvel, sua maior rival. 


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