"Batman: o Cavaleiro das Trevas", de 2008, é o segundo filme da chamada "Trilogia Nolan", certamente o conjunto de histórias do Batman com maior aprovação e até mesmo aclamação pelo público e crítica até hoje. Como eu escrevi no post anterior sobre "Batman Begins", o diretor Christopher Nolan optou por contar a história do homem morcego a partir de uma perspectiva sombria e até certo ponto realista, uma escolha que se manteve em "Cavaleiro das Trevas". Desta vez, o roteiro do filme foi reforçado pela participação de Jonathan Nolan (irmão do diretor), uma parceria que já havia acontecido em "Amnésia" (2000) e "O Grande Truque" (2006), além do último filme da trilogia do Batman.
Em "Cavaleiro das Trevas", temos o prosseguimento da história de "Batman Begins", só que desta vez o grande vilão da vez é o Coringa, o inimigo mais importante de Batman. O Coringa, que nasceu nos quadrinhos na década de 40, já havia sido abordado em outras ocasiões no cinema e TV, como na clássica série de televisão da década de 1960 e principalmente no filme de Tim Burton de 1989, interpretado por Jack Nicholson em um dos papéis mais importantes de sua carreira. Em 2008 o ator escolhido para interpretar o Coringa foi Heath Ledger, em uma atuação magistral que lhe rendeu o Oscar póstumo de melhor ator coadjuvante, já que o ator faleceu em janeiro de 2008 por overdose de medicamentos (segundo as investigações uma ingestão acidental) antes mesmo do lançamento do filme que o imortalizaria na história do cinema.
Por conta da atuação de Heath Ledger e de sua morte prematura, é impossível não admitir que o Coringa rouba a cena de "O Cavaleiro das Trevas" desde o prólogo do filme, uma inteligente e divertida cena de assalto a um banco. O próprio Batman torna-se um coadjuvante frente a forte presença do vilão de cabelos coloridos e cara pintada, com um comportamento psicótico que é ao mesmo tempo doentio e sereno. Uma das características mais interessantes do Coringa é que ele não possui grandes motivações para os crimes que comete. O seu objetivo é instalar o caos em Gotham City, sem que ele próprio necessariamente usufrua de algum benefício com isso. Apesar desta ação desinteressada, o Coringa se alia a mafiosos e outros criminosos para conseguir aquilo que deseja, o quase sempre se resume em destruir o Batman e a sua reputação como justiceiro.
A presença deste vilão interessante e cuidadosamente interpretado por Ledger faz o filme ganhar muito em qualidade, porque o roteiro ganha maior liberdade para seguir caminhos imaginosos sem a perda de verossimilhança do primeiro filme. É que a conduta imprevisível do Coringa acaba por tornar o próprio filme uma sucessão de eventos inesperados e pouco conexos, ao ponto de nós espectadores nos concentrarmos mais nos planos anárquicos do antagonista do que propriamente no roteiro intrincado e um pouco infrutífero dos irmãos Nolan. Existe um outro vilão na história, o Duas-Caras, que também está presente no filme do Tim Burton de 1989, mesmo que com muito menos destaque do que em "Cavaleiro das Trevas", onde é um dos protagonistas. A presença do Duas-Caras no filme, assim como o Comissário Gordon, é a isca do roteiro para trabalhar questões éticas envolvendo a conduta do Batman, que no filme gera uma ambiguidade quase tão grande quanto o clássico quadrinho homônimo de Frank Miller de 1986. Eu confesso que já desisti de discutir o Batman na perspectiva da ética do super-herói, porque eu nunca sei afinal de contas qual a posição política dos escritores e roteiristas sobre o assunto.
É muito comum que a crítica e o público se refiram à "Cavaleiro das Trevas" como o mais importante filme de super-herói já feito, o que eu mesmo já concordei, mas que hoje penso diferente. De fato, não dá pra negar que o segundo filme da trilogia de Nolan seja um salto gigantesco rumo à qualidade técnica em filmes do gênero, especialmente pelo uso magistral e fascinante da tecnologia IMAX, restrita às cenas de maior impacto do filme. A presença do Coringa também é um elemento que faz o filme algo memorável, mas penso que o roteiro dos irmãos Nolan ainda deixou muito a desejar em termos de capacidade de criar uma história com personalidade o suficiente para que o filme entre na história não só por sua forma, mas também pelo conteúdo. As muitas e vazias frases de efeito dos irmãos e a manutenção de clichês como o do vilão asiático e os cartéis de drogas faz de "Batman: O Cavaleiro das Trevas" um filme de ação com roteiro simplório, porém muito bem confeitado pelo talento de seu diretor, o IMAX e a atuação inesquecível de Heath Ledger.
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