Quem vai ao cinema assistir "Yesterday" pode inicialmente acreditar que vai encontrar um filme descolado e despretensioso, um pequeno cult instântaneo feito para celebrar uma das maiores bandas de todos os tempos: os Beatles. Mas o novo filme de Danny Boyle não é nada disso. Ao contrário do que o título do filme e o trailer possa sugerir, a premissa de "Yesterday" é muito mais parecida com a de qualquer outra comédia romântica do tipo "melhores amigos que se apaixonam" do que a de um filme original sobre como seria um mundo sem os Beatles.
Antes de falar sobre os principais problemas de "Yesterday", cabe destacar que o conceito do roteiro é por si só bastante criativo. No filme, acompanhamos a história de um jovem músico aspirante a uma carreira profissional, mais um dos milhões de músicos que todos os dias amarguram trocados em shows vazios e com público desatento. Acontece que esse jovem sofre um acidente justamente no dia em que o planeta vivencia um "apagão global" de pouco mais de dez segundos. Quando acorda, o protagonista descobre que depois do blackout os Beatles deixaram de existir. Ninguém conhece a banda a não ser ele mesmo. É óbvio que o garoto decide recorrer a sua memória prodigiosa, reescreve todas as canções do quarteto e lança as músicas pro mercado como se fossem suas, tornando-se um fenômeno internacional.
Pra deixar a história mais atrativa pro público jovem, a produção do filme teve a ideia de escalar no elenco o músico Ed Sheeran como o "padrinho" do protagonista, o que até certo ponto foi um grande acerto, porque ele atua bem interpretando a si mesmo e oferece momentos bem humorados que outros personagens nem chegam perto. A dupla protagonista, por outro lado, foi um erro fatal. Himesh Patel tem problemas sérios de interpretação, principalmente porque aparentemente só tem uma expressão facial para qualquer que seja o seu sentimento. Lily James (interpretando a melhor amiga e paixão platônica do protagonista) também está muito mal no papel, apática e com uma personalidade chata que deve ter irritado boa parte dos espectadores que dificilmente entenderam porque ela preferiu romper com seu amor platônico a tentar encontrar uma solução que conciliasse amor e carreira.
O roteiro é sofrível, com muitas tiradas sem graça, apesar de boas intenções ao inundar a história com referências às letras dos Beatles. Essas referências, no entanto, são muitas vezes forçadas e mal introduzidas na história, principalmente quando o roteiro tenta brincar com elementos da cultura pop. É claro que é interessante ouvir as canções dos Beatles tocadas e ouvidas pelo público como se fosse pela primeira vez, ainda mais quando o filme dá a elas uma nova roupagem, no estilo "voz e violão". Mas o grande problema é que o filme deixa a todo momento de se preocupar com a temática "Beatles" para abordar o drama entediante do romance "vai não vai" dos protagonistas, chegando a se esquecer completamente do quarteto em cenas longas e tediosas como a sequência em que os dois pombinhos protagonistas perdem uma possível noite de sexo em um hotel de luxo em Liverpol.
Já faz tempo que considero tudo que Danny Boyle dirige ruim, de modo que só fui ao cinema com altas expectativas porque não sabia que o filme era dirigido por ele. Mas depois acabei descobrindo a autoria do longa nos tão aguardados créditos finais, porque do meio para o fim do filme eu já estava ansioso pra história acabar. Creio que esse problema no andamento do filme está ligado ao fato de que a ideia do roteiro, mesmo que criativa, tem uma grande limitação: o (talvez inevitável) desfecho simplista e até mesmo constrangedor para quem tem tanta afeição pelos Beatles. Há um discurso bobo e saudosista de que as pessoas jamais deveriam esquecer da banda, como se algum dia isso tivesse chegado perto de acontecer, além de uma representação pouco plausível de um dos membros do quarteto de Liverpol. Se houve um momento que me empolguei, foi quando ouvimos "All You Need is Love" em um concerto em Wembley. Só que eu me arrepiei não pelo momento em si, mas porque me lembrei dos shows do Paul McCartney. Um filme dispensável e que só valerá a pena pela boa coletânea que é a sua trilha sonora.
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