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quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

O Mágico de Oz


De todos os filmes que já assisti na vida, "O Mágico de Oz", de 1939, foi um dos primeiros. Lembro que conheci o filme através da minha mãe, que alugava VHS's pra mim nos fins de semana. À época, um dos aspectos que mais me marcava no filme era o preto e branco dos primeiros minutos da história, que me causavam um certo assombro principalmente na cena em que a casa de Dorothy é levada por um furacão. Subitamente, o filme se tornava um conto de fadas colorido e magicamente atrativo aos olhos de uma criança, que era fisgada em um instante pelas canções, os figurinos e a originalidade dos personagens da terra dos Muchkins. 

Lembro que a impressão que o filme me passava era o de uma peça de teatro sofisticada ao alcance dos meus olhos quantas vezes eu quisesse, com a vantagem de poder pausar, avançar e retroceder a história a meu gosto. Não foi por acaso que "O Mágico de Oz" sempre foi o filme mais alugado por mim em todas as locadoras que frequentei.

Uma das cenas iniciais do filme, que enganava o espectador fingindo que seria uma obra em preto e branco. Era o início do uso da cor no cinema.

A origem do filme é um livro infantil homônimo escrito e publicado em 1900 por L. Frank Baum, um insistente escritor e editor norte-americano cujo maior sucesso foi mesmo "O Mágico de Oz" e suas mais de dez continuações na literatura. A originalidade da história e a suas possibilidades de adaptação para outros gêneros artísticos logo tornou possível que fosse escrito e montado um musical para o filme, apresentado na Broadway durante a primeira década do século XX. Baum morreu em 1919, vítima de um AVC, mas em 1939 o seu livro, musical e algumas pouco conhecidas adaptações da história para o cinema motivaram a MGM a comprar os direitos de adaptação do livro, depois de uma briga acirrada com os estúdios Disney, embalados pelo sucesso de "Branca de Neve e os Sete Anões" no ano anterior.

Àquela época, o "technicolor", ou seja, os filmes coloridos, eram uma novidade no cinema, de modo que "O Mágico de Oz" foi um dos primeiros longas metragens a fazer uso da técnica. Isto certamente motivou e muito a expectativa pelo filme, que acabou indicado ao Oscar naquele ano em seis categorias, incluindo melhor filme. O longa venceu apenas nas categorias de "melhor trilha sonora" e "melhor canção original", por "Over the Rainbow", uma das músicas mais célebres da história do cinema.

A clássica cena em que Dorothy (Judy Garland) canta "Over the Rainbow", escrita especialmente para o filme. Na foto vemos a atriz e e o cão "Totó", que na verdade era uma fêmea que participou de mais de 20 filmes em Hollywood.

O longa foi dirigido por Victor Fleming (um cineasta que morreu aos 59 anos, mas que apesar da morte prematura venceu um Oscar de melhor diretor). Aliás, o seu filme mais premiado foi "E o Vento Levou", também de 1939, o que acabou provocando a sua renúncia na direção de "O Mágico de Oz" em determinada fase da produção, pois teria que se dedicar ao épico sobre a guerra civil americana que lhe rendeu um monte de Oscars naquele ano, o que acabou sendo no final das contas uma decisão muito sábia.

De posse dos direitos do livro, a MGM então escalou um elenco interessante para "O Mágico de Oz", sendo que a atriz de maior sucesso foi sem dúvidas Judy Garland (1922-1969), que à época tinha dezesseis anos. A primeira opção dos estúdios para interpretar Dorothy foi a atriz mirim Shirley Temple (que tinha então onze anos), mas os produtores desistiram da ideia por razões envolvendo a sua potência vocal. Garland então foi convidada a interpretar uma personagem muito mais jovem que ela, de modo que a produção precisou esconder no filme o busto da atriz, que era incompatível com a idade de Dorothy na história original.

Judy Garland era uma estreante em 1939, mas em pouco tempo se tornou uma das atrizes mais importantes da história do cinema, vencedora do Oscar na versão de 1954 de "Nasce uma Estrela", no mesmo papel que mais tarde Lady Gaga iria interpretar em 2018. Garland morreu prematuramente e sua história foi contada no filme "Judy" (2019), que deu o segundo Oscar à atriz Renée Zellweger.

O elenco principal quase completo. Os produtores escalaram atores e atrizes vindos do teatro, com experiência em números musicais.

"O Mágico de Oz" é a história de Dorothy, uma criança moradora do Kansas que tem a sua casa levada por um tornado até um mundo fantástico chamado "Oz". Ao chegar em Oz, a sua casa pousa bem em cima da Bruxa Malvada do Leste, que acaba morrendo. Essa feliz coincidência transforma Dorothy (sempre acompanhada do seu cãozinho Totó) em uma celebridade local, mas a jovem quer a todo custo voltar pra sua fazenda no Kansas, onde mora com os tios. A história gira em torno da travessia de Dorothy pela estrada de tijolos amarelos, que a levará até o Mágico de Oz, único capaz de fazê-la voltar pra casa. No caminho desse "road-movie a pé", Dorothy encontra três amigos - um espantalho, um homem de lata e um leão - cada um deles carente de algo que também querem pedir ao Mágico.

A antagonista da história é a Bruxa Malvada do Oeste, que quer a todo custo vingar a morte da irmã e tomar de volta os seus sapatos de Rubi (que foram roubados da bruxa morta). É preciso dizer que a Bruxa vilã, interpretada por Margaret Hamilton (1902-1985), é um dos pontos altos do filme. Sua caracterização icônica com o rosto todo pintado de verde e uma gargalhada fatal é uma das mais célebres representações de uma vilã no cinema. À época, acreditava-se que uma boa bruxa era uma bruxa sensual (como havia acontecido em "Branca de Neve"), mas os produtores decidiram mudar de ideia e contrataram uma atriz fora do padrão de beleza da época. Segundo contaram os envolvidos na produção do filme, a bruxa era tão bem interpretada que algumas cenas foram cortadas por serem consideradas assustadoras demais para o público infantil.

A Bruxa Malvada do Oeste é um dos pontos altos do filme, como uma vilã assustadora.

Como a primeira adaptação da história original foi feita para o teatro musical, na Broadway, creio que esta seja a razão para o gênero ter sido replicado na versão cinematográfica. A todo momento a história é contada através de canções, muitas delas verdadeiros clássicos do cinema e da cultura popular norte-americana. É o caso de "Over the Rainbow", a canção mais famosa  e melancólica do filme, bem diferente do restante das músicas do longa, que são divertidas e dançantes. Quando Dorothy chega à terra dos Munchkins (pequenos seres simpáticos e coloridos que foram interpretados por atores anões) praticamente toda a narrativa é feita através das músicas "Ding-Dong! The Witch Is Dead" e "We're Off to See the Wizard".

Na estrada de tijolos amarelos, a mesma canção é usada para introduzir os três novos amigos de Dorothy, com letras e coreografias diferentes de acordo com cada personagem. Impressionam os figurinos, as maquiagens e os cenários da produção, que foi toda feita dentro de estúdio, com apenas uma cena externa (a dos créditos iniciais). Os sapatos de Dorothy, que no texto original eram prateados, se tornaram vermelhos no filme por sugestão de um dos dezesseis roteiristas que adaptaram o livro para os cinemas. O filme tem efeitos especiais inovadores para a época, como a cena da neve no campo de papoulas, a sequência do furacão e algumas tomadas em que a Bruxa Má do Oeste passeia de vassoura no céu.

Os Munchkins são figuras muito originais no filme e renderam histórias de bastidores hilárias, pelo suposto mau comportamento dos atores-anões nas filmagens. Mas dizem que as anedotas não passavam de invenções propagadas por Judy Garland.  

Todos os atores e atrizes envolvidos na produção de "O Mágico de Oz" relataram em entrevistas posteriores como era difícil trabalhar no filme, por conta das jornadas longas, as maquiagens e os figurinos pesados. O que provavelmente deve ter tornado as coisas menos difíceis era o fato de que o investimento da MGM na obra foi milionário e havia uma ampla equipe à disposição (além de Fleming, outros quatro diretores trabalharam no longa). Além disso, o elenco foi muito bem escolhido e contava com alguns dos mais importantes artistas de teatro do Estados Unidos, que pouco a pouco iam migrando para o cinema, um negócio relativamente recente e muito mais lucrativo.

Uma das histórias mais conhecidas sobre a produção do longa é o caso da alergia que quase matou o ator inicialmente escalado para viver o homem de lata. O ator teve uma intoxicação respiratória após inalar o pó da sua maquiagem feita à base de alumínio e descobriu mais tarde ter sido trocado por outro artista para o papel quando ainda estava em recuperação no hospital, o que o magoou para sempre. Outro incidente no set foi um pequeno incêndio nas cenas de fumaça com a Bruxa Má do Oeste, que sofreu queimaduras durante as gravações. Aquele era o momento em que os atores viviam o início da aplicação de efeitos especiais em obras cinematográficas, sendo obrigados muitas vezes a experimentarem protótipos de criações que os colocavam em grande risco.

Judy Garland descansa em um dos intervalos das gravações do filme. A atriz sofria menos do que os colegas, que tinham um figurino pesado e usavam muita maquiagem. Ao fundo, vemos os atores que faziam os Munchkins.

Como era comum em histórias infantis do século passado (e talvez seja até hoje), "O Mágico de Oz" tem uma moral explícita para o seu público. A vida de Dorothy no Kansas era literalmente apagada e ainda mais difícil porque o cachorro da criança era perseguido por uma vizinha. Ainda assim, Dorothy quer a todo momento voltar pra casa e pro aconchego de seus tios. A possível contradição de uma criança querer voltar pra casa mesmo estando em um mundo mágico como o de Oz é naturalmente explicada porque Dorothy quer viver ao lado dos tios, onde se sente segura e protegida.

Além disso, o retorno da garota para casa demonstra a reconciliação de Dorothy com a família, já que ela estava insatisfeita com os tios que não se opuseram quando a vizinha malvada levou o seu cachorro. Para além disso tudo, a história também trabalha com a constante busca do ser humano pelo alcance de um sonho ou felicidade externa a ele, mas que na realidade já se encontra dentro de si. Isso vale tanto para os desejos dos amigos de Dorothy quanto para a própria garota, que descobre que tinha a todo momento a chave para voltar pra casa, sem que ao menos precisasse de um mágico pra isso.

O filme segue um pouco a lógica do "tudo depende de você", que muito permeou a cabeça dos norte-americanos protestantes empreendedores como foi Frank Baum, o escritor de "O Mágico de Oz". Este é um filme doce e mágico que toda criança e adulto sensível deve assistir.

2 comentários:

  1. Que post completo!! Várias curiosidades incríveis aqui... O fato desse filme ter sido o que vc mais alugou na infância explica sua boa memória para cantar todas as músicas com uma alegria saudosista dessa época (mt fofo inclusive). The witch is deeeeeead é a MELHOR canção, sem dúvidas hahahaha. Os efeitos especiais são realmente muuuuito bons mesmo vendo hoje, imagine pra época?! A bruxa voando é muuuuuito bem feito!!! Não podemos nos esquecer do melhor ator do filme: TÓTÓ (sempre impecável em quase todas as cenas, já que ele realmente aparece em quase todo o filme). O figurino da bruxa boa é simplesmente tudoooooo, muito lindo e brilhoso, eu realmente queria um igualzinho pra chamar de meu rs. Filme lindo, colorido, mt bem feito e mt fofo!

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    1. Hahahha é mesmo, eu deveria ter dado uma atenção maior pro fofinho do Totó!
      E quem sabe vc n consegue um figurino daquele pro dia do seu casamento? heim! hahahah beijocas

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