"Juno" foi o filme indie mais comentado do ano de 2007, com baixo orçamento e uma temática espinhosa: a gravidez na adolescência. Assisti na época em que foi lançado e lembro especialmente de Ellen Page - a atriz protagonista - e a trilha sonora folk, que é uma cerejinha a parte no filme, sem dúvidas um cult instantâneo. Ambientado nos típicos subúrbios dos Estados Unidos, o filme seria hoje um pouco esnobado pelo público jovem da década de 2010, que certamente classificaria o roteiro como uma imersão em um "white people problem", mais ou menos como aconteceu com "Lady Bird", de 2017. Revendo o filme hoje, considero que rotulá-lo assim não seria bem uma injustiça.
A protagonista, Juno, tem um comportamento muito pouco natural quando descobre que está grávida após uma transa casual com seu melhor amigo, Paulie. Ela tem uma personalidade meio blasé, mas essa indiferença é irregular ao longo da história. A descoberta da gravidez parece afetá-la pouco. Não há desespero, este não é o escopo da história. O que Juno decide em pouco tempo é que não quer a criança de nenhuma forma, encontrando duas maneiras de fazer isso. Primeiro pensa em abortar, mas é desencorajada por uma amiga militante em defesa do direito dos bebês. Diante desse conflito moral e ético, acaba optando por entregar a criança a um casal bem sucedido que por alguma razão não consegue ter uma criança pela via tradicional.
Há um relativo aprofundamento na vida da protagonista, através da exploração pelo roteiro da relação com os pais, figuras diferentes e bem representadas por dois grandes atores: J.K Simmons e Allison Janney. Ellen Page também é responsável por isso, porque atua bem e segura a onda interpretando uma personagem um pouco contraditória, que transita entre a imaturidade forçada do mundo escolar e a dureza de enfrentar uma gravidez sem nenhum apoio do pai da criança. Aliás, abandono parental poderia ser um dos temas da história, porque o "namorado" de Juno demonstra pouco ou nenhum interesse pelo filho e muito menos pela sua companheira grávida. Esse desequilíbrio entre os pais do bebê é sem dúvidas um recurso do roteiro para frisar quem de fato carrega o fardo de uma gravidez, principalmente quando ocorre de forma precoce.
Existe uma preocupação do filme em explorar recursos estéticos que pudessem identificá-lo como uma obra cult, caso contrário a história poderia parecer "mais do mesmo" ou de pouco brilho. Essa identidade é artificialmente criada com alguns elementos, como o sofá abandonado no gramado, o cachimbo vazio que Juno sempre carrega, os tic-tacs que Paulie é viciado e alguns outros símbolos no cenário e nos figurinos que - a bem da verdade - até que funcionam, mas não são espontâneos ou propriamente originais. A música é um fator positivo, bem como as referências pop nas cenas em que Juno conversa com o futuro pai adotivo de seu filho, um sujeito que nutre por ela uma espécie de admiração ou paixão que não sente mais pela esposa.
"Juno" é um filme com temática bem delimitada, que peca pelo tratamento superficial de temas que poderiam sim ser aprofundados em uma comédia pouco pretensiosa. Ao não dar ao público o devido detalhamento de assuntos mais complexos - como o aborto, a adoção e o divórcio - o roteiro agiu com certa apatia quando deveria desenvolver aquilo que importa mais na história do que a cor do sofá que Juno senta ou o modelo de seu telefone. A estética "cool" do filme se sobrepôs ao roteiro, que ainda que tenha sido premiado no Oscar em 2008 falhou muito ao retratar de maneira mais convincente a maternidade, mesmo sendo a protagonista uma jovem relapsa quanto a sua condição. Deste modo, o filme perdeu a oportunidade de provocar reflexão em seus espectadores, o que é um pecado considerando a importância da abordagem do tema da gravidez na adolescência.
Nenhum comentário:
Postar um comentário