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segunda-feira, 23 de março de 2020

Jurassic Park


Steven Spielberg já era um verdadeiro criador de clássicos quando dirigiu "Jurassic Park" em 1993, um dos filmes mais importantes da sua carreira. Se analisado a partir do seu potencial de entretenimento, creio que este filme seja uma das maiores referências e um dos exemplos mais bem sucedidos da história do cinema comercial, nome dado para aquele tipo de filme que você assiste comendo pipoca. Isto para não dizer que a obra é uma verdadeira lição do que se deve fazer para divertir e agradar um público convencional e familiar.

Feito este preâmbulo necessário, podemos partir para uma análise do filme que no Brasil ficou conhecido como "Parque dos Dinossauros", uma tradução muito acertada.

Cartaz clássico do filme, que costumava enfeitar muitas locadoras na década de 1990.

As minhas primeiras lembranças de "Jurassic Park" datam da minha infância, tanto do filme original de 1993 quanto das duas continuações que foram lançadas quando eu era criança. Me lembro particularmente do terceiro filme da série, de 2001, que assisti no cinema. Quanto ao primeiro, as minhas lembranças são quase todas das muitas e muitas vezes que aluguei o filme em VHS, cuja fita de vídeo vinha em uma caixinha bem elaborada em alto relevo, que a dona da locadora gentilmente me deixava levar pra casa tamanho o meu fascínio por cinema e pelo filme.

É claro que para o olhar de uma criança, o que me chamava a atenção no filme eram os modelos incrivelmente realistas (até mesmo para hoje) dos dinossauros recriados, o que não era muito comum no cinema até então. Para falar a verdade, poucos filmes se aventuraram a reviver dinossauros até hoje, principalmente numa perspectiva mais naturalista como em "Jurassic Park". As demais aparições de dinossauros no cinema são em animações ou em filmes B, talvez com exceção de "King Kong", que apesar da aparência grosseira dos animais em sua versão original permanece um clássico.

A famosa cena com o Brontossauro. Spielberg posicionou os atores de modo a criar uma escala entre o tamanho humano e o gigantismo dos dinossauros recriados em computação gráfica.

O roteiro de "Jurassic Park" foi baseado em um livro de mesmo nome, publicado por Michael Crichton em 1990. Do romance original (que não li) vieram as principais ideias e a base científica do filme de Spielberg, que se apoia bastante em uma explicação muito razoável sobre como foi feita a recriação genética dos dinossauros, mesmo que seja pura ficção. Do livro também vieram as citações que o filme faz sobre a Teoria do Caos para relacioná-la com a catástrofe que acontecerá no parque dos dinossauros durante o filme, confirmando as previsões de um personagem prático e racional, chamado Ian.

Aliás, os personagens são muito bem introduzidos nos primeiros minutos do filme pela direção de Spielberg, que precisa de pouco para nos traçar um pouco da personalidade de cada herói ou vilão na história. Em síntese, o que move o filme é a visita de dois importantes paleontólogos e um matemático ao novo Jurassic Park, empreendimento criado por um velho milionário chamado John Hammond. Os cientistas visitam o parque a pedido de um investidor, que quer ter certeza que o local é seguro para ser aberto à visitação pública.

Drª Ellie (Laura Dern), o matemático Ian (Jeff Goldblum) e Dr. Alan (Sam Neill) são os representantes da ciência e da razão no filme, em contraponto aos interesses comerciais de John Hammond (foto abaixo).

Richard Attenborough (1923-2014) interpreta John Hammond, o empresário que por ambição e imprudência perde o controle de suas criaturas.

O parque de John Hammond fica em uma ilha isolada na Costa Rica e tem um diferencial: é o único no mundo onde os visitantes podem conhecer dinossauros de verdade, recriados a partir de engenharia genética. Como todo bom filme de Spielberg, há um vilão na história, representado por um improvável e medíocre cientista glutão chamado Dennis que, às escondidas, faz um acordo com concorrentes de Hammond. Em troca de uma boa quantia em dinheiro, o espião fica encarregado de roubar dos laboratórios do parque embriões de dinossauros.

A parte mais divertida (e assustadora) da história é que Dennis decide roubar os embriões bem no meio de um passeio da equipe de cientistas pelo parque, desligando todo o sistema de proteção contra os dinossauros ferozes e colocando a vida de todo mundo na ilha em risco. A cena mais célebre dirigida por Spielberg é, sem dúvidas, quando os jipes com os visitantes ficam presos na região onde vive o Tiranossauro Rex, uma das espécies mais mortíferas de dinossauro. 

O programador Dennis (Wayne Knight) cumpre o papel de vilão no filme ao ser o agente responsável pelo caos previsto pelo matemático Ian.

O tempo todo o filme brinca e aborda a ideia do homem versus natureza, seja através do temperamento arrogante e imprudente do milionário John Hammond seja através do comportamento do espião Dennis, que despreza tanto o seu chefe quanto as criaturas por ele criadas. O que Hammond precisa no filme é o aval de especialistas que garantam que seu parque é seguro para os investidores, mas desde os primeiros minutos do filme tanto os cientistas Dr. Alan Grant e Dra. Ellie Sattler e o matemático Ian estão convencidos que parece inconciliável dar nova vida a seres que habitaram a terra a mais de 60 milhões de anos.

É muito interessante a maneira como o filme trabalha as implicações éticas entre os conflitos de interesses financeiros e comerciais do empresário e a opinião embasada de cientistas, que oscilam entre o entusiasmo e a preocupação com a obra de Hammond.

A cena do T-Rex é um dos marcos do filme e do cinema de Steven Spielberg. A computação gráfica foi aliada de um modelo robótico criado com muitos detalhes.

Os velociraptores também são personagens importantes no filme e ganharam ainda mais destaque nos outros filmes da franquia. Na foto acima vemos a famosa cena da cozinha. 

O matemático Ian faz as vezes do sujeito pessimista na história, que alerta a todo momento que tudo vai dar errado e se direcionar ao caos, porque segundo ele a natureza sempre encontra um jeito de driblar os desígnios do homem. E é exatamente isso o que acontece, porque Hammond entrega a sua confiança a um parque todo criado por computadores, seja na sua infraestrutura e segurança, seja na própria criação dos dinossauros como produtos de laboratório. A câmera de Spielberg sabe abordar esse prisma ético e filosófico da história, sem que o filme perca a sua maior capacidade: entreter.

Os detalhes filmados pelo diretor vão desde a água que se balança suavemente indicando a aproximação de um T-Rex até a maneira como o diretor filma pelicanos voando na cena final, para em seguida nos mostrar um helicóptero, demonstrando com muita sutileza que há sim uma linha evolutiva entre dinossauros, aves e seres-humanos, mas uma linha que de modo algum significa que haja superioridade da nossa espécie para com outras, mas sim respeito e aprendizado com a ciência e a história. Este talvez seja o maior mérito de "Jurassic Park": estimular a nossa humildade como Homens perante a natureza.

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